terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Pequeno dicionário Eder Fabrício de ideias polêmicas (parte 1)


Gosto de conceitos e definições. Sendo engenheiro e economista, percebo-os como essenciais para meu "entendimento matemático" do mundo. Daí que resolvi dedicar um post a alguns conceitos e definições que se revelam na minha cabeça de uma forma diferente de como se revelam na cabeça da maioria das pessoas com quem troco ideias. Chamo-o "Pequeno dicionário Eder Fabrício de ideias polêmicas".


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JUSTIÇA. Palavra vazia, desprovida de significado exatamente por se permitir muitos. Foi uma palavra inventada por um sujeito muito sagaz, provavelmente na Roma Antiga, para confortar pessoas descontentes com alguma situação e convencê-las a remunerá-lo por essa "palavra de conforto". O sujeito mostrou ser possível ganhar bastante dinheiro com a ingenuidade de pessoas que tenham problemas e não procurem (ou não consigam) racionalizá-los. Ao longo das gerações seguintes, legiões de pessoas sagazes imitaram a técnica desse guru para ganhar dinheiro. No mundo contemporâneo, esses seguidores do "guru da justiça" dividem-se em 3 grupos: juristas, políticos e religiosos.

Para mostrar que a palavra é desprovida de significado, exatamente por conter muitos, pense em dois exemplos. No primeiro, um adolescente é assassinado. Familiares dão entrevistas aos jornais dizendo que querem "justiça". Vizinhos fazem passeata pelas ruas gritando: "Justiça! Justiça!". Mas pergunte a eles: "O que é justiça?". Um responderá que é o assassino "pagar pelo que fez". Pagar como? Em dinheiro? Outro dirá que é colocá-lo na cadeia. Isso conforta a família? Será? Por quê? Um terceiro aderirá ao "olho por olho, dente por dente" do Código de Hamurabi e dirá que "bandido bom é bandido morto". Mas, afinal: por que esses três desfechos possíveis do caso parecem "justos" aos seus respectivos defensores? O que é "justo" pra uns é "justo" para os outros?

Segundo exemplo: partida de futebol entre Corinthians e Ibis. Durante os 90 minutos, o Ibis manda no jogo, mas não no placar. Teve 30 finalizações contra nenhuma do Corinthians, sendo 5 chutes na trave. Aos 48 minutos do segundo tempo, o Corinthians, em seu primeiro ataque no jogo, marca 1x0. E o jogo acaba. Justo? Por quê? O Corinthians não foi mais eficiente? Ou será que o "justo" pra um não é igual ao "justo" pro outro?

Conclusão: se quisermos "forçar" uma definição para "justiça", ela será assim... Justiça é quando as coisas acontecem do jeito que eu gostaria que acontecessem. Problema da definição: não é universal... não leva necessariamente ao mesmo resultado pra mim e pra você.

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IGUALDADE. Esse sim é um conceito matemático, exato, simples, fácil de entender e importantíssimo. No entanto, opinadores das ciências sociais costumam referir-se a ele em certas discussões com uma palavra inapropriada: justiça (que, conforme já explicado, é uma palavra vazia). Fala-se muito em "justiça social" com o significado de "igualdade social". E esta é, embora matematicamente exata, uma das ideias mais estapafúrdias já pensadas pela mente humana. A noção de "igualdade social" afronta a própria natureza humana. O ser humano é instintivamente competitivo, quer ser melhor em algumas coisas (depois que se convence da impossibilidade de ser melhor em tudo). E, para ser melhor, necessariamente tem que ser diferente, não pode ser igual. A competição não necessariamente é predatória, destruidora para o outro. Não necessariamente o sujeito irá se incomodar se o outro sair-se bem, desde que ele se saia melhor (ou ao menos tão bem quanto). Se ocorrer uma igualdade, será por um processo natural de equivalência de forças, algo endógeno, não algo "imposto por força maior".

Um economista chamado Karl Marx formulou um dos melhores modelos da história do pensamento econômico em termos de capacidade de explicar os fatos (ótimo modelo explicativo): a ideia de que os arranjos sociais se baseiam nas lutas entre classes e que a própria dinâmica dessas lutas faz com que umas classes ora sobressaiam, ora sucumbam. Mas as extensões que o próprio Marx fez desse modelo, que ele apelidou de "socialismo" e "comunismo", revelaram-se desastrosas na capacidade de prever os fatos vindouros (péssimo modelo preditivo). E uma razão essencial para esse fracasso foi ignorar a índole competitiva da natureza humana.

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DIGNIDADE. Finalmente um conceito de que cientistas sociais deveriam ocupar-se mais - e que costuma passar ao largo de livros e trabalhos sobre economia. Eu chamo de dignidade o padrão mínimo de qualidade de vida. Algo que qualquer pequeno grupo de cientistas das áreas de nutrição, saúde, urbanismo e educação são capazes de conceituar minuciosamente - e com conceito único e universal, sem as ambiguidades e "achismos" da "justiça". A definição exata de dignidade sustenta-se em 3 pilares: alimentação, habitação e educação.

"Alimentação digna" é algo que qualquer nutricionista que se preze é capaz de detalhar: as quantidades mínimas diárias de carboidratos, proteínas, minerais, etc, para uma vida saudável.

"Habitação digna" também é facilmente passível de definição técnica. Refere-se a ter abrigo contra as intempéries, com um padrão mínimo de cômodos (quartos, banheiros, cozinha e área social), de área útil por pessoa e de infraestrutura (água encanada, tratamento de esgoto, terreno estável e condições de segurança).

"Educação digna" é acesso a uma formação ampla, que envolva o máximo de campos da habilidade humana, amparado por especialistas em tempo integral, desde o nascimento até o final da adolescência.

Ao contrário da igualdade, a dignidade universal sim é algo a ser buscado. Os seres humanos não devem e não querem ser iguais (se fôssemos todos iguais a vida seria insuportavelmente entediante e, além disso, não evoluiríamos nem como indivíduos nem como espécie). Não precisamos de igualdade. Mas devemos ter dignidade. Todos!

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Próximos verbetes do pequeno dicionário: Estado, política, governo, equilíbrio, educação, casamento, fé, natureza, Deus.

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